quarta-feira, 25 de junho de 2014

A copa mundo na rua da nossa casa


Moro na Borges, num assentamento urbano que fica na famosa escadaria. A copa em porto alegre ocorre no estádio beira rio, que fica numa avenida que é a continuação da nossa, a um quilômetro daqui. Sou alheia ao futebol. Não vi nenhum jogo da copa. Sei de alguns resultados porque vivo em sociedade e porque faço parte daquela gente que sempre torce pra um país latino, africano ou asiático, contra os ianques e os europeus, pelo gosto de poder derrotar, ao menos simbolicamente, os colonizadores e os imperialistas.
Fui comprar café e pão nessa manhã, do outro lado da rua, e me caiu a ficha. Nossa rua está bloqueada, porque hoje, novamente, milhares de cidadãos e cidadãs do mundo passarão por aqui, pela calçada de casa. 
Semana passada, passou uma marcha imensa de holandeses festeiros. Outro dia ouvi um som intenso de surdo, e uns gritos firmes de guerra, achei que fosse outra multidão chegando, mas não. Era uma meia dúzia de libaneses, com uma latente empolgação, muito séria e aguerrida. Ontem à noite a nossa calçada estava cheia de uruguaios resplandecendo uma alegria linda, emocionada, contagiante, depois do resultado do jogo contra a Itália, 1x0. Hoje é o dia dos argentinos, barulhentos e desconfiados, passarem por aqui. Acho que se sentem em território inimigo, chegam imponentes, reivindicando o mestre Maradona com aqueles cantos típicos Dale Dale ô... Pela nossa avenida também desfilou indignação e terror. As marchas contra a copa ocorrem todos os dias de jogo. Denunciam o que sofre o povo de todo país que recebe um mundial, pra se adequar às exigências homéricas e esdrúxulas da Fifa. Atrás da gente indignada, passa o choque, com aquele passo marcado. Coletes, cassetetes e escudos da covardia vestem os militares que seguem a marcha das pessoas com seus cartazes. Atrás do choque passa a cavalaria armada. Atrás da cavalaria, os camburões. Atrás dos camburões, as ambulâncias. Um efetivo exagero que causa mais medo do que segurança na gente.
Pela rua da nossa casa passa um pouco da copa do mundo, e as suas intrínsecas contradições. Beleza e medo, festa e desigualdade, diversidade e preconceito, machismo e amor, covardia e alegria... E a estranha sensação de sermos mundo.


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