terça-feira, 30 de novembro de 2010

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(Fonte: vasculhando outro dia nos arquivos do nuances - grupo pela livre orientação sexual - encontrei essa genialidade. O caderninho que tem essa arte na contra capa se chama Rompa o Silêncio, e não tem ano, infelizmente.)

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Palavras que valem compartilhar: Vandré, por Mauro Iasi.


De todas as mortes que carrego,
marcadas em minha alma feito cicatrizes,
de todos os crimes da ditadura
um me dói de forma especial.

Não é a multidão de mortos
com seus corpos dilacerados.
Não são os ossos perdidos
que buscam por seus nomes.

Não é o tiro
o choque
o murro.

É o poema que não foi feito,
a música inacabada,
aquela melodia presa na mente
soterrada pelo medo.

Os dedos inúteis longe das cordas,
o acorde que nunca foi desperto,
os olhos secos das lágrimas justas,
a voz calada.
Que requinte mas perverso de crueldade:
matar alguém e deixar seu corpo vivo
como testemunha da morte inacabada.


Mauro Iasi

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Hora de partir.



Tão longe estamos. Mas às vezes, com a ajuda da luz do sol e do vento que trás uns sinais, conseguimos avistá-la.

Falo daquele sonho antigo que tanta gente sonhou e não sonha mais. Aquele sonho que nos relega, as e os jovens militantes, à condição de idealistas, por sonhá-lo.

E eu não falo do socialismo, ainda que volta e meia eu faça uma defesa dele. Falo de algo ainda mais saboroso, mais colorido, mais inteiro, mais essencial e ainda mais humano, que está por vir.
É de comunismo que uns chamam. Mas nós, cristãs e cristãos, gostamos de chamar de Civilização do Amor. E eu acho um nome bem apropriado.

A vontade de escrever dela, desta civilização, veio de longe. Mais precisamente da Venezuela, de uma cidadezinha que se chama Los Teques.
Lá, entre montanhas, num clima parecido com o do sudeste brasileiro, vivemos um Congresso Latino americano das Pastorais da Juventude.
Por mais que o clero local, que organizou o evento, tentasse abafar, estava presente todo o tempo, de algum modo, sinais del gobierno revolucionário.

( Lá, a igreja é inimiga do governo porque o governo garante que o estado seja laico. E as escolas católicas correm o risco de serem extintas, tendo em vista que, num país democrático, a educação também deve ser laica.

Lá, ao invés de o governo sair por aí construindo casas nos confins das cidades para “solucionar o problema” da moradia, existem os consejos comunales que são conselhos comunitários onde a comunidade se organiza pra acessar recursos públicos e a decidir a forma como os utilizará. Com esse recurso constroem casas, estradas, escolas, investem em cooperativas solidárias, em melhorias diversas. E o coletivo não é massacrado pelo indivíduo. E o indivíduo não é massacrado pelo coletivo.

Lá, nas esquinas, ou em entradas de galerias, ou em bancas de jornal se vendem leis e a constituição federal. Lá as pessoas compram leis e mais do que isso, lá as pessoas conhecem as suas leis.
Lá o presidente é cristão e cita o evangélho em quase todos os seus discursos.

Lá acontecem feiras de La revolucion alimentaria, onde se vendem produtos de qualidade com o menor preço. Lá a fome está sendo extinta, assim como foi extinto o analfabetismo e o medo. )

O congresso latino americano das PJs valeu pelos encontros que promoveu. Pela galera linda, de luta e de fé que reuniu.
Mas poderia ter sido muito melhor, se a história fosse outra. A Teologia da Libertação vem sendo matada lugar a lugar, e essa maldição já chegou ao Brasil. Temos poucos anos de vida pela frente, isso se resistirmos muito.
E não sei se resistiremos, pois temos praticado algo como uma auto-censura, que é filha do medo de morrer, que nos inculcaram. Nós mesmos, jovens da Teologia da Libertação, temos medo de assim nos dizermos.
 
É como se tivessem nos encontrado ilegais, no porão de uma igreja, e aí abrimos os sorrisos mais falsos que temos e, por medo, negamos tudo que temos feito pelos anos. E prometemos não fazer mais. E um a um de nós vamos indo embora, entregando nossas esperanças e abandonando a igreja católica apostólica latinoamericana, da práxis libertadora que estávamos construindo.
Falo de todo trabalho de despertar da consciência crítica, trabalho de formar jovens militantes de um mundo melhor, de formar gente com esperança, com fé na vida e vida nos olhos. Todo trabalho junto das comunidades mais abastadas, mais esquecidas e mais desejosas de mudança, de onde fazemos brotar o desejo ardente de lutar.

É nesse tempo que sinto viver, dentro da nossa igreja. Tempo de farta colheita, de inúmeros jovens lutadores, militantes esclarecidos, e de uma igreja velha que não suporta nossa beleza e nos ameaça de morte.
Tempo de perseguição por um lado, e por outro, tempo de covardia.
Nós temos medo por dentro.

E assim apartamos nosso sonho da nossa prática, e, mesmo avistando um horizonte lindo lá na frente, rumamos por outro caminho, que não leva para lá, obedecendo a quem nos nega. E temos medo, nem sei mais do quê.
Tomara que eu esteja errada, ou no mínimo, exagerando. Tomara.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Celebração das Contradições


"Desamarrar as vozes, dessonhar os sonhos: escrevo querendo revelar o real maravilhoso, e descubro o real maravilhoso no exato centro do real horroroso da América.

Nestas terras, a cabeça do deus Elegguá leva a morte na nuca e a vida na cara.

Cada promessa é uma ameaça; cada perda, um encontro.
Dos medos nascem as coragens; e das dúvidas, as certezas.

Os sonhos anunciam outra realidade possível e os delírios, outra razão.

Somos, enfim, o que fazemos para transformar o que somos.

A identidade não é uma peça de museu, quietinha na vitrine,
mas a sempre assombrosa síntese das contradições nossas de cada dia.
Nessa fé, fugitiva, eu creio. (...) "


Eduardo Galeano, falando por nós. (sugiro ele pras tardes cinzas, pras manhãs ensolaradas, pras noites chuvosas, solitárias ou bem acompanhadas. Pro bom e pro mal humor. Sugiro sempre que a alma precisar de alimento.)

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Eleições 2010. É possível votar crítica e conscientemente?

Não costumo dedicar meu tempo para emitir opiniões sistematizadas sobre as eleições porque quase sempre, uma ou outro, produzem sínteses muito melhores do que eu seria capaz de produzir. Aí eu leio, me encontro, e me dou por satisfeita, multiplicando o que li.

Acontece está difícil de concordar inteira e politicamente com alguém. Antônio Callado disse certa vez que a esquerda brasileira nem existe, e já está dividida. Odeio ter que concordar com ele, ainda que parcialmente. (Queria mesmo era lhe responder, com humor, Antônio, calado!).

Se tem sido complicado dizer quem apoiar, começo por apontar quem eu nego.

Nem o Serra nem o seu partido teriam meu voto, nem a minha confiança, em qualquer circunstância. E a razão é bem objetiva: a bandeira que levantam é a bandeira do neoliberalismo. O projeto que defendem com clareza é o que extermina milhares de jovens pobres, o que amplia o abismo das desigualdades, o que aprofunda as injustiças sociais e econômicas em detrimento do interesse de sua classe.

Aqui vale uma observação: não defendo a idéia que associa cidadania e democracia ao voto. Sou daquele grande grupo de pessoas que compreende que o voto é parte de um projeto limitado de democracia. Não basta votar “certo”, como dizem. É preciso participar, se organizar. Não dá pra acreditar que um indivíduo só, se eleito, fará a revolução. Essa certeza, creio eu, é um dos aprendizados que a história recente nos deu.

O PT é um partido com uma história linda. Dilma é, sem dúvida, uma grande mulher. Combatente da ditadura militar, temida pela mídia e pela direita, tem postura, tem história, tem identidade com o partido. Mas o PT já não é o mesmo. O governo Lula é um governo de avanços e é um governo neoliberal, a um tempo. Nessa condição, se aproxima mais à melhora do capitalismo, à exemplo de Vargas, do que à construção das condições reais do socialismo, a exemplo de Allende - presidente chileno que chegou à presidência por via democrática e fez uma verdadeira revolução democrática e popular no país. No Rio de Janeiro, por exemplo, se encontra um partido dos trabalhadores identificado com a burguesia, aliado ao PMDB, partido promotor da política pública para a juventude pobre chamada ‘O Caveirão’, que sobe o morro para matar e para nada mais. Em Belo Horizonte se aliou com a sua oposição(PSDB) e envergonhou toda a esquerda. Vários são os candidatos a deputado federal que fazem girar milhões de reais, cuja origem ninguém sabe. Cito alguns do meu estado: Paulo Pimenta, Marco Maia, Paulo Ferreira. Se elegerão com o 13 nas suas legendas, manchando outra vez a história do partido. Não faço vista grossa. O PT vive a sua pior crise ideológica e nele não dá para confiar às cegas, como já fizemos um dia.

Marina sempre teve meu respeito. Apesar de divergir em alguns pontos, sempre vi nela uma forte mulher amazônida, bem posicionada,destemida, coerente até. Mas ser candidata pelo PV? Com todo o respeito que tenho pelo setorzinho progressista do partido, o PV é um partido empresarial, da classe média e da alta, burgueses com a consciência ambiental pesada. Porque o PV, Marina? Este é um partido michê, oportunista, que se vende a quem mais oferece. Nas últimas eleições se aliou ao PSDB e ao PSOL em diferentes regiões do país e já foram da base aliada do Lula. Não. O PV não. Não nos iludamos novamente com super personalidades. Marina não salvará nem o PV, quem dirá o Brasil, como tem dito.

Plínio tem também meu respeito, minha admiração. Pense numa pessoa simples, que, mesmo sendo candidato à presidência da república participa de encontros com menos de 30 pessoas e conversa com qualquer um que lhe chega. Ele tem muitas virtudes políticas, bem como a Dilma, a Marina, o Zé Maria até. O problema é que não se deve votar apenas em indivíduos. Vota-se, especialmente, em projetos, em coligações partidárias, em ideologias. Não em pessoas. E é por isso que esse notável militante histórico não pode ter o nosso voto. PSOL é um partido da classe média que não dialoga em nada com o vida real do povão, por uma razão muito simples: no PSOL não há ninguém do povão. No RS o partido aceitou dinheiro da Gerdau e da Taurus, duas multinacionais riquíssimas que exploram intensamente o povo, - especialmente das cidades de Sapucaia do Sul e de São Leopoldo, minhas cidades - e fazem por aí o discurso da autonomia. Em outras palavras, reproduzem exatamente os mesmos vícios do PT, que alegaram na sua ruptura. Reconheço que no RJ o PSOL conta com uma militância muito mais coerente, comprometida com a vida das pessoas. Mas bem que alguém poderia dizer: lá o PSOL só se dá bem na esquerda porque lá o PT é de direita. A grande missão do PSOL, desde a sua fundação em torno da super personalidade Heloísa Helena, foi combater o PT a qualquer preço, inventando uma realidade paralela como se o maior problema do Brasil fosse o PT e não o capitalismo financiado pelas mega empresas que também financiam o PSOL...

Duas considerações finais: para votar, podemos levar em conta, em síntese, 3 aspectos: a história do partido, a trajetória d@ candidat@ e as pessoas que conhecemos, filiadas a esse partido, que fazem campanha para essa pessoa.

Essas eleições nos ensinam, uma vez mais, que devemos votar sim para que o pior não aconteça – nesse cenário, nada seria pior que a eleição do Serra.

E mais do que isso. Nos ensinam que o Brasil não muda apenas através da política partidária, que defende, na maioria das vezes, os interesses dos indivíduos que a dirigem. O que muda o Brasil são, necessariamente, as pessoas que insatisfeitas com a sua condição, forjam o motor mais forte da revolução, a organização criativa, solidária e rebelde do povo.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Ainda sobre as contradições.



Um trabalhador no corte de cana corta e carrega, em média, 12 toneladas por dia, divididas de 15 em 15 Kg. Realiza em média 36.630 flexões e perde 8 litros de água. Caminha 8.800 metros e despende 366.300 golpes de podão. Os que cortam menos que 10 toneladas diárias são demitidos antes de completar três meses de contrato.

Quantas horas trabalham, quantos sóis enfrentam, quantas dores sentem, quantas vidas morrem esses trabalhadores para que tenhamos nossos cafés adoçados, ou para que aqueles poucos que lucram tanto com o etanol e com o alcool enriqueçam ainda mais?

O regime de trabalho e o salário que recebem os trabalhadores do corte da cana, chamados bóias frias, é um dos mais injustos do mundo.

Não há trabalhador que faça opção pelo trabalho escravo. Tampouco existe a necessidade de submeter alguém a este regime em pleno século XXI, quando há maquinários modernos apropriados para o corte de cana de precisão.

As contradições, que movem o Brasil e o mundo, são profundas demais. A irracionalidade do capitalismo ultrapassou qualquer limite e já não se pode mais falar em suportá-lo. Por aqui, a justiça parece se tornar cada dia mais distante.

É por isso que hoje, no século XXI, no ano de 2010, mais do que nunca, faz muito sentido falarmos em socialismo; num sistema onde já não haja empobrcidos, humilhados, escravos, porque não haverá milhonários roubando nossas forças, nem nossas saúdes, nem nossos desejos.

Sua urgência aumenta a cada dia quando um trabalhador da cana ressucita para a labuta que o matou no dia anterior;

quando cada empresa decide explorar e roubar ainda mais o mundo e ainda mais gentes para aumentar seu lucro;

quando cada trabalhador adoece de tanto vender, por misérias, suas mãos de obra;

quando cada jovem tomba nas periferias brasileiras (são quase todos negros e são todos pobres);

quando cada indignação se veste de esperança e sai pra se encontrar com outras, pra dançar a ciranda da resistência e enfrentar.

terça-feira, 11 de maio de 2010


"Assim como hoje se fala em direitos dos homossexuais, daqui a pouco vão achar os direitos dos pedófilos." (Dom Dadeus Grings, Arcebispo de Porto Alegre, em declaração oficial sobre a pedofilia e a igreja).

Dom Dadeus,

Com todo o respeito (que o senhor não tem), chega de declarações infames sobre a pedofilia e, principalmente, a respeito da homossexualidade! Nós cristãs e cristãos nos envergonhamos e nos desanimamos com essas palavras de criminalização. Trate de tomar providências em relação à pedofilia dentro da igreja, por que dos direitos dos homossexuais tratamos nós, cidadãs e cidadãos desejosos da justiça social, da diversidade, da tolerância, do respeito e da democracia.

Costumo dizer que a igreja católica, que antes de ser católica é cristã, não é uma. É pelo menos quatro, segundo João Batista Libânio. Portanto não devo me envergonhar em ser católica, mesmo com as declarações recentes do arcebispo. Pertencemos a cenários distintos de uma mesma igreja. O bispo à igreja conservadora da opus dei, eu à igreja da práxis libertadora.

Mas como é dificil... Como me dizer católica por aí se um pastor de minha igreja criminaliza @s homossexuais e @s coloca no mesmo patamar dos padres pedófilos? Como consentir com tamanha hipocrisia de quem, ao defender a igreja das acusações de pedofilia, acusa oprimid@s gratuitamente? Tenho certeza que estamos em lados opostos. Nós, do lado dos gays, das lésbicas, das travestis, d@s negros, dos indígenas, dos empobrecidos, d@s jovens, das mulheres que são sujeitos de direitos e de suas vidas. Eles, do lado da moral opressora que presta um desserviço enorme ao cristianismo, à liberdade e à democracia.

Perdoem-me companheir@s defensores da unidade dos cristãos. Mas não pude me calar indiferente.

Por uma igreja libertadora e por um estado laico!

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Blogs são ferramentas muito interessantes. A cada dia me interesso mais, apesar de não ter tempo para escrever. Visito inúmeros, geniais. Dentre estes, quero sugerir o "uma liberdade virtual", de car@s e querid@s companheir@s. Hoje, como na maioria dos meus dias, não tive uma inspiração teórica sistematizada para postar. Vale dizer que a nossa inteligência é multipla, colorida, criativa, concreta não podendo ser expressa apenas através da escrita. Hoje tive um insite fotográfico, visual. E fiz essa montagem que coloquei no topo do blog, com a ajuda do Sebastião Salgado e do Carlos Marighella, para dar mais beleza a este espaço - um pouco da beleza que acredito verdadeira -na vontade de dizer o que ultrapassa as palavras.

E a boa imagem é aquela que fala sozinha, sem tradutores pretenciosos. A imagem que quer dizer exatamente o que diz.

A dedico às corajosas e aos corajosos que encontram sentido para as suas vidas na luta por um mundo melhor.

segunda-feira, 8 de março de 2010



Hoje é dia de reflexão, de luta, de questionamentos, de irreverência, de desobediência. Não é dia de festa, nem de parabéns, nem de obrigados, nem de compras, nem de rosas vermelhas, nem de chocolates.

O que marca este dia é a organização das mulheres em torno do desejo da libertação e da autonomia, há extatos 100 anos.

E hoje, eu que sou feminista, cristã e de esquerda, guardo esse dia para estar junto às companheiras da Marcha Mundial de Mulheres, em sua terceira ação internacional, machando pelo estado de São Paulo no desejo de que todas sejamos livres. Guardo também um sorriso, como esse aí de cima, na alegria esperançosa de ser mulher, de ser feminista.


Abaixo, uma poesia, uma brincadeira, uma oração:


"Ave Marias, Luisas, Carmens e todas as mulheres
Cheias da graça de ser mulher,
Casadas, solteiras, separadas, divorciadas,
Trabalhadoras rurais ou urbanas,
De todas as idades e cores,
Bendita sois vós,
E abençoadas sejam vossas obras, sorrisos e corações.

Nada Santas Marias, Elaines, Vilmas,
Mulheres de todos os tons,
De corpos franzinos, opulentos ou esguios,
Trabalhai na construção de um novo mundo,
Contemplando paz, igualdade e amor,
Perdoando as injustiças e ajudando a exterminá-las,
Pois vós sois,
A beleza do amanhecer desenhado nos olhos do ser.
Mulher."