quinta-feira, 1 de julho de 2010

Eleições 2010. É possível votar crítica e conscientemente?

Não costumo dedicar meu tempo para emitir opiniões sistematizadas sobre as eleições porque quase sempre, uma ou outro, produzem sínteses muito melhores do que eu seria capaz de produzir. Aí eu leio, me encontro, e me dou por satisfeita, multiplicando o que li.

Acontece está difícil de concordar inteira e politicamente com alguém. Antônio Callado disse certa vez que a esquerda brasileira nem existe, e já está dividida. Odeio ter que concordar com ele, ainda que parcialmente. (Queria mesmo era lhe responder, com humor, Antônio, calado!).

Se tem sido complicado dizer quem apoiar, começo por apontar quem eu nego.

Nem o Serra nem o seu partido teriam meu voto, nem a minha confiança, em qualquer circunstância. E a razão é bem objetiva: a bandeira que levantam é a bandeira do neoliberalismo. O projeto que defendem com clareza é o que extermina milhares de jovens pobres, o que amplia o abismo das desigualdades, o que aprofunda as injustiças sociais e econômicas em detrimento do interesse de sua classe.

Aqui vale uma observação: não defendo a idéia que associa cidadania e democracia ao voto. Sou daquele grande grupo de pessoas que compreende que o voto é parte de um projeto limitado de democracia. Não basta votar “certo”, como dizem. É preciso participar, se organizar. Não dá pra acreditar que um indivíduo só, se eleito, fará a revolução. Essa certeza, creio eu, é um dos aprendizados que a história recente nos deu.

O PT é um partido com uma história linda. Dilma é, sem dúvida, uma grande mulher. Combatente da ditadura militar, temida pela mídia e pela direita, tem postura, tem história, tem identidade com o partido. Mas o PT já não é o mesmo. O governo Lula é um governo de avanços e é um governo neoliberal, a um tempo. Nessa condição, se aproxima mais à melhora do capitalismo, à exemplo de Vargas, do que à construção das condições reais do socialismo, a exemplo de Allende - presidente chileno que chegou à presidência por via democrática e fez uma verdadeira revolução democrática e popular no país. No Rio de Janeiro, por exemplo, se encontra um partido dos trabalhadores identificado com a burguesia, aliado ao PMDB, partido promotor da política pública para a juventude pobre chamada ‘O Caveirão’, que sobe o morro para matar e para nada mais. Em Belo Horizonte se aliou com a sua oposição(PSDB) e envergonhou toda a esquerda. Vários são os candidatos a deputado federal que fazem girar milhões de reais, cuja origem ninguém sabe. Cito alguns do meu estado: Paulo Pimenta, Marco Maia, Paulo Ferreira. Se elegerão com o 13 nas suas legendas, manchando outra vez a história do partido. Não faço vista grossa. O PT vive a sua pior crise ideológica e nele não dá para confiar às cegas, como já fizemos um dia.

Marina sempre teve meu respeito. Apesar de divergir em alguns pontos, sempre vi nela uma forte mulher amazônida, bem posicionada,destemida, coerente até. Mas ser candidata pelo PV? Com todo o respeito que tenho pelo setorzinho progressista do partido, o PV é um partido empresarial, da classe média e da alta, burgueses com a consciência ambiental pesada. Porque o PV, Marina? Este é um partido michê, oportunista, que se vende a quem mais oferece. Nas últimas eleições se aliou ao PSDB e ao PSOL em diferentes regiões do país e já foram da base aliada do Lula. Não. O PV não. Não nos iludamos novamente com super personalidades. Marina não salvará nem o PV, quem dirá o Brasil, como tem dito.

Plínio tem também meu respeito, minha admiração. Pense numa pessoa simples, que, mesmo sendo candidato à presidência da república participa de encontros com menos de 30 pessoas e conversa com qualquer um que lhe chega. Ele tem muitas virtudes políticas, bem como a Dilma, a Marina, o Zé Maria até. O problema é que não se deve votar apenas em indivíduos. Vota-se, especialmente, em projetos, em coligações partidárias, em ideologias. Não em pessoas. E é por isso que esse notável militante histórico não pode ter o nosso voto. PSOL é um partido da classe média que não dialoga em nada com o vida real do povão, por uma razão muito simples: no PSOL não há ninguém do povão. No RS o partido aceitou dinheiro da Gerdau e da Taurus, duas multinacionais riquíssimas que exploram intensamente o povo, - especialmente das cidades de Sapucaia do Sul e de São Leopoldo, minhas cidades - e fazem por aí o discurso da autonomia. Em outras palavras, reproduzem exatamente os mesmos vícios do PT, que alegaram na sua ruptura. Reconheço que no RJ o PSOL conta com uma militância muito mais coerente, comprometida com a vida das pessoas. Mas bem que alguém poderia dizer: lá o PSOL só se dá bem na esquerda porque lá o PT é de direita. A grande missão do PSOL, desde a sua fundação em torno da super personalidade Heloísa Helena, foi combater o PT a qualquer preço, inventando uma realidade paralela como se o maior problema do Brasil fosse o PT e não o capitalismo financiado pelas mega empresas que também financiam o PSOL...

Duas considerações finais: para votar, podemos levar em conta, em síntese, 3 aspectos: a história do partido, a trajetória d@ candidat@ e as pessoas que conhecemos, filiadas a esse partido, que fazem campanha para essa pessoa.

Essas eleições nos ensinam, uma vez mais, que devemos votar sim para que o pior não aconteça – nesse cenário, nada seria pior que a eleição do Serra.

E mais do que isso. Nos ensinam que o Brasil não muda apenas através da política partidária, que defende, na maioria das vezes, os interesses dos indivíduos que a dirigem. O que muda o Brasil são, necessariamente, as pessoas que insatisfeitas com a sua condição, forjam o motor mais forte da revolução, a organização criativa, solidária e rebelde do povo.

11 comentários:

mão disse...

meu amor, não me lembro quem disse que "não importa o que fizeram de nós, importa o que faremos com o que fizeram de nós".
a gente vê muita amargura nesse texto, que talvez reflita a situação que estamos hoje, a dificldade de pensar a política criticamente como você fala
mas é preciso manter acesa a esperançã crítica e a rebeldia transformadora

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Li e gostei muito da análise! Posso dizer, sem exagero, que ela é brilhante, inclusive por conseguir combinar uma visão abrangente com capacidade de síntese. Embora haja simplicações, reconheço que elas fazem parte da operacionalidade política e, o mais importante, tocam no principal. Não negaria nada do que está escrito aqui... apenas complementaria com o seguinte: a militância que se pretende VERDADEIRAMENTE SOCIALISTA, não consiste na luta pela garantia do menos pior. Contudo, é verdade que são necessárias análises sóbrias da real correlação de forças de um possível e desejável projeto socialista brasileiro (além do campo "progressista" ou "democrático-popular"), assim como é importante não cairmos no sectarismo. Pessoalmente, tenho refletido sobre a importância de radicalizarmos cada vez mais as lutas ao mesmo tempo em que encontramos instrumentos cabíveis à realidade. Nesse contexto, concordo que o ápice da luta revolucionária não se encontra (mais)necessariamente nos partidos, assim como não vejo possibilidade alguma de revolução sem a contribuição dos instrumentos políticos da classe trabalhadora concretizados na forma-partido e na forma-movimento social. Bom, para não me estender demais, só queria terminar com uma pergunta: com que "povômetro" se mede as organizações onde está o povão de verdade? O "povão" é uma classe social? Professores da rede pública podem ser considerados "do povão"?

Unknown disse...

Ah! Só mais uma pergunta: todos os partidos de esquerda estariam fadados à traição, ao fracasso, etc. ou existe algum que ainda esteja em disputa, que possa ser construído para avançar, etc.?

Oposição Eletricitária disse...

Gostei do texto, faz uma análise legal da atual situação política brasileira do ponte de vista de uma militante socialista. Talvez pudesse complementar dizendo que vivemos um momento de grande dificuldade de mobilização de massas, e que isso determina também os rumos políticos do governo, uma vez que temos um governo permeável às manifestações sociais.

Fernando Freitas disse...

Jurava que ia ter algo que me esclarece-se neste texto, mas só veio confirmar minhas angustia, em SP para senador, estamos ferrados, temos netinho de paula e marta suplicy, e outros de direita e varios desconhecidos, se for pensar somente em minha situação voto na Dilma, pois estou dentro de uma faculdade federal, mas o pt, não é mais o mesmo, não é? ou sempre foi isso, e não sabíamos?

Anônimo disse...

Nem ao menos sei se você vai se lembrar de mim, rs. Sou da CRPJE mineira, e este ano voto pela primeira vez. A dúvida de qual candidato escolher é imensa, mas a dúvida e o medo de estar fazendo a escolha errada é maior ainda. Fico feliz de alguém como você concordar com minhas poucas opiniões. Saiba que me ajudou bastante com seu texto e a análise me arranjou um rumo. É preciso conscientizar e sensibilizar o povo de que precisamos representar melhor nossa liberdade.
Beijo grande !

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mauro Cabano disse...

Tenho exercitado a capacidade de escuta, apenas ouvir, sem a prtenção de responder ao ouvido. Desejo até fazer um curso de escutatória, para assim ouvir melhor, deixar que as palavras ouvidas cheguem ao coração. Passo aqui apenas para dizer que li cada palavra e ouvir cada uma, uma a uma. E certa vez me contaram a história de um garoto ou garota de uma terra diferente da nossa, em que se fazia reverência a cada pergunta sábia, ou seriam palavras sábias? Não importa, quero te dizer, minha Linda, que minha reverência limitou-se ao chão, pois não pude ser capaz de untrapassá-lo ao me deparar diante de tão sábias palavras. Não tenho nada a comentar, deixo apenas a minha humilde reverência...

Silvestre disse...

oi, tabata! Como estas compañera!?
La verdad me gustó mucho leer "Algo a dizer?". Mientras iba leyendo pensaba en que ciertamente uno puede ver muchas personas que se presenten con cualidades que nos gusten, nos atraigan y que estamos dispuestos a votar... pero lo cierto es que debemos votar Proyectos Estrategicos. Y más que votarlos, debemos construirlos, como pueblos latinoamericanos debemos tomar nuestro propio destino y construirlo con militancia, compromiso y pasión. Otra cosa que creo importante es lo que señalas con claridad, al comienzo y al final del articulo: el enemigo principal! En el contexto de las elecciones, Serra es el enemigo principal. Y pensando más en general, como povo brasilero, y povos latinoamericanos, o capital financiero transnacional y las empresas vinculadas a ellos son NUESTRO ENEMIGO PRINCIPAL. Hay mucho camino por recorrer, pero la principal virtud que debemos tener en la lucha, es saber comprender el momento en el que se está y cual es el paso a dar colectivamente.
Te envío un fuerte abrazo, desde la distancia, abrazamos a ese pueblo hermano de brasileros y brasileras, porque como dijo un paisano de todos nosotros: "Mientras exista una nación esclava, la libertad de las otras correra peligro".
beijos
Emi

Silvestre disse...

Ahh, sobre a frase dita aqui, e de Jean Paul Sartre, y tein como o fundamento a conceçao de libertade!
Disculpas por mi portugues ruin jaja