quinta-feira, 7 de julho de 2011

De coragem e esperança.





Parafraseando Lenin me justifico por não ter escrito antes sobre o que ocorreu na nossa universidade."É mais agradável e útil viver a revolução do que escrever sobre ela."


Mesmo assim, compartilho um breve e humilde relato dos nossos dias frios e intensos de junho de 2011, na PUC-RS.


O clima de tensão era óbvio. Eramos cerca de trinta estudantes mobilizados ou por compor as chapas que concorreriam às eleições do CONUNE ou porque participávamos de um coletivo de estudantes por democracia que reunia semanalmente no 5º andar do prédio das Humanas. Gente de vários cursos e de distintas experiências de militância, havíamos nos encontrado por já não ser possível suportar a obcenidade que rolava no nosso DCE. Foram quase 25 anos de uma mentira repetida na qual ninguém acreditava. E que se mantinha, literalmente, à força. Os caras não realizavam eleições, nunca prestavam contas, passavam os dias jogando playstation na sede e com o nosso dinheiro cheiravam pó e tod@s sabíamos. O estopim foram as tais eleições das delegadas e dos delegados pro Congresso da uNe, o que era um fiapo do novelo. A oposição ao DCE tinha 3 chapas com 52 membros cada, tal qual exigia o DCE. Mas nenhuma das três foram homologadas e nenhum motivo razoável, até hoje, fora apresentado.

As agressões físicas se iniciaram no dia em que fomos pedir satisfações oficiais quanto à não homologação das chapas. Três homens nos agrediram com força, me jogando covardemente pro chão e empurrando com violência uma colega da psico. A "justificativa" da violência era a de que o DCE iria fechar e que não podíamos entrar. Nessa noite fizemos uma plenária e votamos por não acampar em frente ao DCE. Mesmo assim algumas pessoas acamparam e outras se reuniram numa comunidade de resistência, pra discutir sobre os próximos passos da nossa luta por democracia e contra a violência na PUCRS.


No dia seguinte fomos mais de 700 estudantes em frente ao DCE gritando por justiça. Vários e várias tomamos spray de pimenta e, além das agressões, fomos citados em diversos processos de autoria da gestão do DCE e da própria PUCRS. O lema da noite do 10 de junho foi 'uma noite pela democracia', e assim acampamos entre cerca de 50 estudantes em frente o nosso DCE, num frio absurdo, vale dizer.


Nos dias seguintes fizemos diversas marchas pela universidade, e crescíamos a cada prédio em que passávamos. Havia ali uma forte consciência coletiva de que juntos éramos capazes de tudo, inclusive de derrubar a velha máfia que esfarrapava a democracia com a tranquila conviência da reitoria. Recordo do brilho nos olhos de diversos colegas meus, do Direito, ao se somarem na marcha da democracia. Dos abraços apertados que ganhávamos daquelas e daqueles que suspeitavam que uma das maiores vitórias era a mobilização em si, que assombrava os supostos donos do poder e que encharcava de esperança os estudantes que, naquele momento, assim como ainda hoje, detinham de fato todo o poder, porque estávamos juntos.


No domingo do dia das namoradas e dos namorados, dia de jogo do inter e dia de frio intenso, reunimos cerca de 70 estudantes pra planejar, nos organizarmos, dividirmos tarefas e criar. E foi na noite do 13 de junho que, entre uns 200, decidimos acabar com a eleição pro CONUNE que o DCE estava realizando, numa sala pequena e escondida do prédio da educação. Entre quatro pessoas, três mulheres e um homem, das 15 que não foram barradas pela segurança, terminamos com a palhaçada. Uma menina do Serviço social sentou sobre a urna e os brutamontes apagaram as luzes para espancá-la. A agrediram sexualmente. E eu, que segurava a porta pra que não fechassem, me atirei sobre a menina e apanhamos juntas. Aquilo durou vários minutos. Quem já sentiu na própria pele a ira do inimigo sabe que o tempo custa a passar. E pior que os ponta-pés e o socos foram as ofensas que escutamos, as ameaças. Enfim, conseguimos lhes tirar a urna, que simbolizava a mentira que marcam as gerações do DCE. E a esvaziamos comprovando que haviam ali menos de 10 votos e nenhuma legitimidade. Eles eram uns 10 machões. Nós, duas meninas dentro da sala, uns 15 estudantes gritando fora dela, uns 250 do lado de fora do prédio e um cinegrafista amador muito perspicáz, um colega da história, que fez com que essas imagens fossem vistas por mais de 60 mil pessoas de todos o mundo.


E no dia seguinte tivemos nossa maior marcha. Acredito que chegamos a 1500 estudantes gritando pelo fim da impunidade, pelo fim da violência contra a mulher, pela democracia na PUCRS. Participamos de um programa de debates da mídia burguesa local contra os caras do DCE. Pena que o debate fora mediado pelo Lasier Martins, renomado jornalista filiado ao mesmo partido da máfia, o PDT. Mesmo assim fomos ganhando espaços na mídia local e apoios fortes de agentes da política identificados com a esquerda e com a nossa luta.

Conquistamos, depois de várias reuniões de negociação com a reitoria, mediadas pela esquerda da câmara de vereadores, pressão pela realização de eleições livres pro DCE até a segunda quinzena de novembro desse ano, com intervenção do TRE. Caso não aconteçam, o DCE deixará de ser reconhecido pela reitoria e perderá a sede e o recurso que lhe passam mensalmente. A ministra dos direitos humanos, Maria do Rosário, além de receber alguns estudantes envolvidos, marcou uma audiência com o reitor pra tratar dos temas das violências e da não democracia na universidade. O secretário dos direitos humanos do estado, Fabiano Pereira, bem como a secretária de mulheres do estado, Márcia Santana, nos receberam e nos deram muito apoio. As vereadoras Sofia Cavedon, Fernanda Melchionna e o Todeschini estiveram presentes em muitas noites e em diversas reuniões, fazendo muita diferença.


Somos hoje um grupo grande, capaz de mobilizar muita gente. E posso dizer que tivemos dois grandes aprendizados nesse momento histórico. Um deles é a relevância da unidade. Se tivéssemos nos pautado pelas diferenças políticas não teríamos conquistado nada. O outro, e, sem dúvida o maior, que remete ao primeiro, é a compreensão de que é possível vencer se acreditarmos e se estivermos junt@s. A Esperança e a superação da divisão são pressupostos para avançar. Como já disse um dia, repito agora com mais força, se trata de ir com quem vai no mesmo rumo e de acreditar que é possível mudar.


.